Aqui vai uma citação de um livro do Brian Eno, traduzida por mim mesmo:

O que quer que seja que agora aches estranho, feio, desconfortável e nojento sobre um novo media vai, com certeza, virar a sua assinatura. A distorção do CD, as falhas do vídeo digital, o som merdoso de 8-bit - todos esses vão ser apreciados e emulados assim que puderem ser evitados. É o som do fracasso: muita arte moderna é o som das coisas a sairem fora do controlo, de um media a ser puxado até aos seus limites e ser partido. O som distorcido da guitarra é o som de algo muito alto para o media que é suposto carregá-lo. O cantor de blues com a voz partida é o som de um choro emocional muito poderoso para a garganta que o liberta. A excitação de um filme granulado, do preto e branco, é a excitação de um testemunhar de eventos demasiado grandiosos para o media escolhido para os gravar.

Isto foi escrito em 1996, muito antes da nossa era onde reinam imensos genéros nostálgicos como o Vaporwave, o Lo-Fi, e por ai adiante, que servem como prova à veracidade da citação. É de loucos o quão certo ele estava. E faz-me pensar, o que é que da música de hoje vai fazer o futuro-eu reconhece-la? Que tipo de som vai me fazer sentir nostálgico sobre a música de hoje?

Evoluímos, e a nossa música evolui connosco. O meu consumo é por um meio digital, streaming pela net. Ainda há limitações, claro, mas são perceptíveis? Eu não acho que a qualidade de som da minha subscrição do Spotify altera o som. E os outros media digitais? O Deezer, o Tidal, o Youtube e tudo o resto? Eles fazem alguma alteração ao volume (Loudness Normalization) mas supostamente não altera o som perceptivelmente. E os meus ficheiros .mp3 de 320kbps que ripo em casa?

Não acho que consigo ouvir nenhuma peculiaridade na música de hoje em dia devido ao media onde é gravada ou onde é tocada. Mas, tanto quanto me lembro, também não ouvia nenhuma peculiaridade nos anos 90 quando ouvia cassetes.

Citação original em inglês:

Whatever you now find weird, ugly, uncomfortable and nasty about a new medium will surely become its signature. CD distortion, the jitteriness of digital video, the crap sound of 8-bit - all of these will be cherished and emulated as soon as they can be avoided. It’s the sound of failure: so much modern art is the sound of things going out of control, of a medium pushing to its limits and breaking apart. The distorted guitar sound is the sound of something too loud for the medium supposed to carry it. The blues singer with the cracked voice is the sound of an emotional cry too powerful for the throat that releases it. The excitement of grainy film, of bleached-out black and white, is the excitement of witnessing events too momentous for the medium assigned to record them.